quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Vidas


Era mais um dia para ela. Um dia em que não vivia.
Chegava ao café, sentava-se na mesa dos fundos e pedia um copo de água.
Esperava que o mundo viesse e fosse embora de lá e continuava sentada.
Por entre leituras disfarçadas de títulos de revistas passadas, ousava ouvir a conversa dos outros.
Ao final da tarde despedia-se dos donos do café com um sorriso entre dentes e vinha embora sem pagar um tostão.
Já a lua estava no seu poiso quando escolhia estrategicamente uma casa para abalar. De 3 em 3 dias marcava presença certeira em 3 moradias térreas.
Sentada ao sofá de cada uma delas, refastelada e abastada de comida e bebida contava estórias de sofrimento, de contentamento, de traição ou de coração. Estórias do mundo que se restringiam a uma meia dúzia de pessoas. As amigas embebidas lá faziam a sua vez de espalhar por mais meio mundo estórias acrescidas às estórias contadas.
E assim viviam, extraordinariamente felizes, a vida das outras pessoas com vida e na ignorância de serem notadas.