terça-feira, 12 de maio de 2009

Folga - Te


Chego do trabalho que hoje lá fez valer o seu nome.
Deixo a água a correr e mais a correr ainda acabo de arrumar a roupa pincelada no chão.
O armário arrota agora de tão cheio e viro-me para a cama que implora que lhe puxe as orelhas.
Mergulho devagarinho o corpo na água quase morna que mesmo assim não impede que a cabeça entre em ebulição.
Revejo um ou três assuntos pendentes e saio a pingar porque me esqueci de trazer a toalha.
E ali estás tu atrás de mim. No reflexo onde apareces sempre comigo.
Às vezes parece que é mesmo verdade mas de todas as vezes que rodo rápido para te apanhar, a única coisa que vejo é o creme que já está à minha espera. E olha que tenho rodado cada vez mais rápido!
Bezunto-me com ele dos pés ao pescoço para voltar a sujar o que estava limpo.
Se aparecesses agora acho que ias gostar de me ver. Assim. Só com ele a cobrir.
Tantas passagens de creme que não te conheceram...
Enrolo-me com o remedeio da toalha de rosto para agora me poder espreguiçar na cama.
Cerro os olhos e os punhos e finalmente a cabeça branqueia.
Pronto, e já está escuro outra vez. 
Inspiro e expiro pelo nariz. Umbigo contra as costas quando expiro. Dez vezes mais duas vezes dez.
Tento meditar e fazer a regressão até ao dia do acidente. Chego à parte em que ainda respiras mas já não falas e...escuro outra vez. Um escuro bem pintado por cima de preto. 
Será que, ao menos, isso aí onde estás é transparente ou custa muito folgar um dia para vires fazer de mim crente?

6 comentários:

ZicKroft disse...

Espera. basicamente tu és como eu, e como o João Pedro País. Não precisas de viver as coisas para as escrever. Ou não?

Gostei. *

Tari disse...

Nunca disse o contrário. Aliás, todas as minhas histórias são ficção e só fiz aquele comentário no teu porque, ao contrário do meu, o teu retrata alguns acontecimentos reais. Para a próxima pergunto antes :P

Obrigada, beijinhos**

ZicKroft disse...

Sempre que abro o teu Blog canto esta música:

"Alopatias, silêncios vagos..."

É algo que me transcende. Assim como quando vejo um burro canto aquela:

"E peço num burrito e lá vou eu..."

Anónimo disse...

Isto podia ser uma cena de um qualquer filme, dependente ou independente :)

Corto

Mário, o Dimas disse...

Todas as ficções podem ser reais. Para quem as lê tornam-se numa história possível, com protagonistas prováveis e esse mérito ninguém lhe pode retirar, pois a sua escrita confere-lhes essa essência. Afinal "São Estórias" paralelas verdadeira realidade da vida. Vou continuar a lê-la. Posso? obrigado.

Tari disse...

Mário, um grande bem-vindo para si. Tem razão em tudo que disse e faço todo o gosto em que continue a sua leitura aqui.
Apareça sempre.